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CONFUSÃO MENTAL

por feldades, em 31.10.14

O tempo passa e eu não tenho o que pôr neste blog. Sei que isso é uma bobagem e não faz sentido ficar preocupado com banalidades, mas um amigo já perguntou sobre o “menu” de hoje.

Enquanto grupos radicais islâmicos esfolam curdos e xiitas no Iraque, sequestram centenas de meninas na Nigéria e crucificam cristãos na Síria, eu fico aqui torrando os neurônios, tentando o ofício de cronista que jamais sou ou serei. Ainda: o ebola, a Peste Negra deste milênio, se alastra na África e semeia pânico pelo mundo, mas eu continuo bobamente olhando para o teclado, preocupado em buscar a quadratura do círculo.

Eu deveria me despedir desses poucos que me acompanham, deixá-los em paz e me afastar para sempre daqui, mas parece que ando interessado na atenção deles. Uma carência tola, sem sentido, pois não há a certeza de se estar acompanhado num espaço como este, que, pela sua natureza, apela para a solidão.

Fosse noutro tempo, eu não precisaria tergiversar, pois havia no computador meia dúzia de inglórios escritos à espera de seus minutos de glória. Mas a má sorte bateu à porta, ou melhor, arrombou-a trazendo consigo um gatuno. A Pituka, cadelinha simpática até com esses noias, permitiu que se adentrasse e levasse o notebook, que nem era note, mas net. Com ele, foram alguns delírios e fragmentos de minha memória na forma de textos. Sorte teve o raríssimo leitor, porque fora poupado, mas eu fiquei meio leso e sem saber o que pôr aqui hoje.

Havia por lá breves relatos sobre minha infância vivida na escola primária, e do tempo de adolescente, quando ensaiava minhas primeiras incursões amorosas – coisa boba, mas muito minha. Havia também muitas fotos, alguns pequenos filmes da família, vídeos com minha mãe.

Para a última postagem, não encontrei dificuldade, pois o assunto brotava para além do teclado. Estava em toda parte, como se fosse pedra de tropeço por onde quer que eu andasse. Não poderia e nem havia como ignorar os acontecimentos que pululavam. Mas agora veio a ressaca.

Daqui, donde estou, olho para a Pituka e o Tokinho, que cochilam tranquilos aos meus pés, deixando-me ainda mais “desinspirado”. Por que não fazer o mesmo? Por que não deixar a arte de escrever para quem tem o dom? “Tem que ter o dão, o dão!”, já me foi dito.

Ah, se eu tivesse o dom, se soubesse escrever, descreveria cenas de um passado distante e esfumaçado, mas que continuam cintilantes como a estrela-d’alva numa manhã enevoada. Mas não consigo. Apenas tento, mas me distraio com a Pituka e o Tokinho, que continuam sonhando com a doce “matilha de totós alados” – os anjos que o Criador lhes oferece como protetores.

Ah, se eu soubesse escrever e se o Tokinho não estivesse por aqui com a Pituka a me fazer inveja! Eu falaria da primavera e de suas flores; dos amores e de suas dores; da solidão tão necessária, e de mim.

De mim?! Esta besta que se ocupa do teclado, mas que precisa corrigir provas, preparar aulas, elaborar atividades..., que ninguém faz.

E a África continua lá, esquecida e devorada pelos mesmos vermes: de ontem, de hoje e de sempre.

FILIPE

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O ADEUS DE LILICO

por feldades, em 24.10.14

Pulblicado originalmente no blogdofilipemoura.com em 14/12/2012

 

Já não se encontra embaixo desta mesa o cãozinho que aqui se aninhara por um bom tempo durante minhas longas “jornadas datilográficas”. Ele, que me acompanhava nas leituras, orações ou nas minhas solitárias e infrutíferas reflexões diárias, deixou-me com uma página em branco. Aconchegando-se sempre sobre o tapete e repousando carinhosamente a cabeça sobre os meus pés feito travesseiro, dormia. Acordando, fingia impaciência ao mordiscar meus dedos, mas também me afagava com sua morna e molhada língua. Caso eu demorasse no recinto, levantava-se e começava a latir como se dissesse que a vida é um tédio; que é preciso dar uma volta para espairecer; e que ver a rua e mexer com a “meninada” lá fora é uma necessidade premente, inadiável.

O “menino”, de pelagem cor de mel, já retratado aqui em crônica intitulada “Fim do dia com Totó”, era um “moleque” travesso. Irrequieto, corria pra lá e pra cá enquanto eu tentava alcançá-lo com a guia para o habitual passeio. Glutão, devorava sua “marmita” num piscar de olhos para aguardar, impaciente, os sobejos de sua companheira. Esta, muito elegante, comia sem pressa e indiferente à pedinchice do gorducho comilão.

Nas nossas caminhadas, enquanto eu lia um jornal, ele me conduzia puxando-me, arrastando-me, como se o “totó” fosse eu.  Embora não fosse um gentleman, não fazia feio. Quando queria se aliviar, procurava sempre um matinho num terreno baldio. Metódico, tinha um ritual para isso: após alguns giros, murchavas as orelhas, e, enquanto esvaziava os tubos, olhava-me zombeteiramente como quem diz: “E aí, não vai fazer também?...”.

Mas o cãozinho parou. Já não brincava, não comia e arqueado por uma nefrite, pouco se animava com os passeios. Parecia-lhe difícil sustentar o peso da cabeça, que pendia abaixo da linha do tronco. Com as narinas espantosamente dilatadas e um olhar triste e profundo, parecia implorar por ajuda. E a ajuda veio na forma de agulhadas; esse anacronicamente cruel procedimento médico, que a todos atordoa, não lhe devolveu a saúde.

Certo dia, ao sairmos para o trabalho, ele se aproximou do portão e tentou latir. Em outros tempos, essa seria uma forma de ele dar tchau ou de dizer: “Não demora, viu? E não se esqueça do meu osso!...” Mas, dessa vez não saiu latido algum. O som emanado de suas entranhas foi uma indizível despedida. O prenúncio do fim. 

O “menino” briguento e sapeca, que aterrorizava a vizinhança por onde passava, mas que cumpriu bravamente a função de sentinela e guardião da casa, fenecia. Desfalecido, envolvi-o numa flanela e o depositei no assoalho de uma fúnebre caminhoneta. O fim.

O Paraíso, que é destinado àqueles que escaparem das chamas, é concebido pelos renascentistas como um lugar repleto de nuvens e anjos. De minha parte, anseio por tal morada ao lado do Criador e daqueles querubins, pois passar a eternidade só com humanos deve ser tedioso. O Criador, com certeza, nos agraciará, também, com a companhia das outras criaturas. Esperam por mim o Lilico, Fokinha, Totó e muitos outros bichinhos. Gostaria de ver também meus porquinhos... que viraram torresmo. E eu lhes pediria desculpas. E não estou sendo herético. “O ser humano, esse gigante”, não deu abrigo à Sagrada Família; os animais acolheram-na em sua manjedoura! Temos muito o que aprender com os bichos.

FILIPE

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O QUE PENSAS?

por feldades, em 17.10.14

Caso tu queiras me acompanhar nestas linhas, já vou avisando: o assunto de hoje é inglório. Falarei de política e sem floreios poéticos. Portanto, não te aborreces, raro leitor. Vai para o “feice”, aquela avenida iluminada, e me deixa só, na escuridão deste beco.

 

De uns tempos para cá, preocupam-me os (maus) ventos que sopram na política nacional. Tenho lido vários depoimentos que servem de reflexão para os mais jovens – ou gente antiga com algum problema de memória. São de pessoas que, contando suas experiências, defendem apaixonadamente o atual governo devido aos avanços sociais nesta última década, mas que estão temerosas. Eu não chego a tanto, pois sou propenso a criticar governos: seja este, os anteriores ou futuros – fruto de meu modo ranzinza de enxergar as coisas. Mania de velho.

 

Os ventos, porém, prenunciam tempestades que ameaçam vir inexoravelmente. O PSDB, que tenta suceder a coligação capitaneada pelo PT, não é um paladino da democracia nem da decência administrativa. Os tucanos são bons de bico, mas não aceitam contestações. Como professor do estado de SP, há mais de vinte anos, posso dar provas disso. Aos fatos:

 

Durante uma assembleia do magistério no vão-livre do Masp, a polícia de Mário Covas jogou bombas na multidão que ali se aglomerava. Balas de borrachas foram disparadas e muitos professores se feriram. E olhe que não havia baderna. O movimento era pacífico, sem quebradeiras, bem diferente das manifestações de junho de 2013. Eu estava lá.

 

Noutra mobilização da categoria, já no governo José Serra, os ônibus que partiam do interior para a capital levando professores eram sistematicamente parados pela polícia para “vistoria”. Muitos daqueles coletivos tiveram que retornar, não podendo chegar até a capital. Havia sempre um “pneu careca” ou algo semelhante. Meu ônibus foi “vistoriado”.

 

Nos tempos em que as escolas já tinham ao menos uma tevê com parabólica, que jamais funcionou, eis que um desses iluminados, não sei se Alckmin ou Serra, resolveu acrescentar mais tevês: uns caixotes imensos, pesadíssimos, que nem tinha como serem instalados, chegavam. Numa escola em que trabalhei havia quatro daquelas “jubartes” sobre uma mesa, literalmente encalhadas. O diretor não sabia o que fazer com aqueles trambolhões, visto que o mercado já dispunha das levíssimas LCD. Dá pra desconfiar, ou ainda não?...

 

Nestes últimos vinte anos de mandonismo tucano no estado de SP, a educação despencou, a violência cresceu, a saúde está coma e falta água.  Vários especialistas apontam incúria do governo paulista na gestão de recursos hídricos. Segundo estes, a Sabesp é uma empresa preocupada apenas em beneficiar acionistas e que nos últimos anos alguns bilhões de reais foram lucrados e distribuídos aos sócios. É o hidronegócio, entende?!

 

O governador de SP, recém-re-re-reeleito, foi vitorioso em 644 dos 645 municípios paulistas, perdendo apenas em Hortolândia. Um desempenho de fazer inveja em “divindades” como Bashar Al-Assad, “rei” da Síria e Vladmir Putin, “czar” da Rússia. Mesmo sem segurança, saúde, educação e água, o “imperador” bandeirante consegue se reeleger folgadamente no primeiro turno. Isso é que é aparelhamento do Estado. Imagina essa turma em Brasília!

 

Por essas e outras é que fico com dona Dilma. Dela pode-se se dizer que é tosca, feia, gorda..., mas é honesta. Nunca se publicou uma única frase em que é acusada de ser ladra ou vadia. E ainda governa para os pobres! Se a classe alta prefere o playboy, é porque essa guerreira não a beneficia. O que pensas tu?

 

FILIPE

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FIM DO DIA COM TOTÓ

por feldades, em 11.10.14

Publicado originalmente em 25/11/2011, no blogdofilipemoura.com

 

É domingo e a noite chega. Modorrenta, como fora a tarde, a manhã, o dia todo. Ao meu lado, descansa o Totó (seu nome é Lilico, mas atende por Lico). No rádio, um programinha muito raso, ralo mesmo. O locutor entrevista um músico de nome... Nem sei. Não consigo acompanhá-los. Parecem-me meio pernósticos – para usar uma expressão chique. Ou metidos a besta – não sendo chique mesmo. Mas já terminou.

O Lico continua ali, ao lado. Agora, está cuidando de uma das patas. Mordisca, mordisca e depois lambe. Fica entretido nesse ofício de manicuro por minutos, até horas. De vez em quando, para e me olha como se perguntasse: “E aí, já acabou?” – “Não, Lico, não acabei e nem sei se vou acabar”, respondo-lhe em pensamento.

Gosto da companhia deste cãozinho. Não sei o que pensa de mim. Aliás, nem sei se ele pensa, mas, aqui neste rancho, ele me conforta com sua presença leve, macia e ofegante. Na “vitrola”, um réquiem de Mozart me ajuda a sepultar o dia que, há horas, finara. E o Lico já se enrosca num tapete próximo à porta. Revira-se de barriga para cima, sem vergonha de expor suas “vergonhas”.

Esse "despudorado" vira-lata, de pelagem cor de mel e uma orelha quebrada, não faz o tipo bom-moço. Apesar de recentemente ter sofrido um AVC, e de estar sendo curado de uma infecção intestinal (diarréia das brabas!), dá bastante trabalho devido ao seu comportamento audacioso, hiperativo.

Lá fora, o silêncio é quebrado por uma chuvinha miúda. Uma chuvinha molha-bobo, conforme diz papai; ou um “fubazinho”, como gosta de dizer mamãe. Aqui dentro, a Orquestra de Budapeste continua sonorizando as partituras mozartianas. Enquanto isso, divago sobre meu cotidiano, sobre as coisas desta vida, e da outra que virá. Sobre a semana que começa logo cedo, na manhã de amanhã. Novos desafios me arrastam para o laborioso e movediço chão da sobrevivência.

FILIPE

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ARMISTÍCIO - ÚLTIMA PARTE

por feldades, em 03.10.14

continuação

 

 A entrevista fluía num movimento pendular: tensão e descontração alternavam-se simetricamente. À afirmação de que ‘governa com mão de ferro’, replicou: “Ah, tá brincando. Sinto que o povo gosta de mim, até porque sou democrático nas decisões”.  Mas voltou a reclamar dos ‘ataques’ no jornal. “Mas esta já é a quarta publicação contra a pinga, e ninguém foi ao jornal para me contestar. Nem esse pessoal que ‘gosta muito do senhor’. Por quê?” “Ah, já me falaram sobre isso. Disseram: ‘não liga não, esse cara é tonto’ (risos). Pode até ser, mas você está escandalizando e São Paulo nos adverte contra isso”. “Mas quem escandaliza mais: o meu texto ou a torre de chope defronte à catedral?” “Empata!” “?!”

 

A conversa, antes dura, depois macia, começou a escorrer, tomando rumos prosaicos. Passou pela minha barba – que parecia mais preta, quando vista à distância, lá no fundo da igreja. ‘Aquela ovelha rebelde, que fica de butuca no que o celebrante fala para depois escrever’. “Você pegou uma frase minha: ‘Herodes bêbado, manda decapitar João Batista’ e pôs no jornal. Como é que eu fico? ...” “Mas eu não disse que foi o senhor”. “Tanto faz”. “Não, tanto não faz. Eu até havia posto o seu nome, mas... Se o senhor não sabe, eu costumo rezar antes de escrever e vou cortando, mudando... E eu rezei antes daquele texto. Aí, eu apaguei seu nome e deixei ‘celebrante’”. “Rezou pouco. Se tivesse rezado mais, teria cortado mais. Se rezasse mais ainda, teria cortado tudo. Sabe, até que você escreve bem. É um texto meio rebelde, meio adolescente, mas escreve bem. Poderia publicar um livro. Se fizer isso, venha aqui, que eu quero fazer o prefácio. Mas se for algo contra mim, nem traga” (risos).

 

O encontro foi chegando ao fim após suas muitas perguntas e reclamações. À queixa de autoritário, respondeu com atas, provando serem colegiadas as decisões. Abriu uma gaveta, fechou; abriu outra e a fechou também. Levantou umas revistas sobre a mesa e pegou uma cruzinha. “Vou lhe dar um presente do Papa Francisco. Pode ver que tem umas ovelhinhas aí, e você é uma delas. Tem uma que é a mais cabeçuda, que é você. Depois procure com calma”. Abri o jornal que trazia e lhe mostrei um livro. “O senhor aceita um presente também?” “Sim, claro. É você quem o escreveu?”, perguntou curioso.  “Não, é meu pai”. “Você ainda tem pai? Tem mãe?” “Tenho, graças a Deus”, respondi com a sensação de quem acaba de completar ‘noventa e oito anos’. Folheou o livro. “Este é seu pai, um santo. Você deveria se parecer mais com ele, mas não parece. Você se parece é com sua mãe, que deve ser santa também, mas é muito brava”. Apenas ri, falar o quê. “Então você é professor”. “Sim, dou aulas de matemática”. “Matemática... Nunca gostei de matemática. Escuta aqui: ainda se ensina logaritmo? Pra que serve isso, meu Deus?...” “É simples. Vou lhe dizer uma única frase e o senhor vai entender a importância dos logaritmos. Suponha que o senhor tenha 500 reais e precise de 600. Por isso, vai aplicar esse dinheiro a juros de um por cento ao mês até que se completem os 600 reais. O logaritmo entra nessa conta: para calcular o tempo em que o dinheiro fica aplicado. Entendeu?” Ele me olhou com cara de quem não quer decepcionar e disparou: “Não entendi nada!” Pegou o livro mais uma vez e leu em voz alta uma pequena dedicatória: ‘Ao D. Pedro Carlos, com o carinho de um filho’. “Carinho de um filho?!” – abraçou-me emocionado.

 

FILIPE

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