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O TRIUNFO DO TERROR

por feldades, em 26.10.18

Mal se equilibrando sobre as patas, um velho cãozinho vagueava pela rodoviária. Mais à frente estava o dono do animal, um senhorzinho também de muitos dias. “Ele tem dezessete anos e eu oitenta e cinco. Nós sofremos, viu... é duro ficar velho.” Aproximei-me daquele homem e quis conversar um pouco, quis ouvi-lo. Ele pegou uma sacola que estava no banco ao lado e pediu que eu sentasse. “Qual é o seu nome?”, perguntei. “Armando. Armando Pires. Esse cachorro é meu. Eu morava em São Paulo e adotei uma cadelinha chamada Biloca, que teve cinco filhotes. Ela foi envenenada e, quando vi, já não dava mais pra salvá-la, porque já estava morrendo. Vi ela morta e os cachorrinhos mamando nela... Deu uma tristeza danada. Aí eu cuidei dos bichinhos, que viveram muito tempo comigo. Este aqui é o último e já vai fazer dezessete anos dia (...).”

 

O homem queria conversar mais, mas meu tempo era curto. Tinha que voltar pra casa, terminar um texto para o blog – que decidi trocar por este. “Olha, muito prazer. Tenho que ir” “Ah, já vai?”, e continuou: “Vou votar no Haddad, viu? Aquele outro é psicopata. Você sabe o que é ‘psicopata’? É gente má. Ele não gosta de pobre, de preto, de homossexual, de gordo, de ninguém cá de baixo. Ele só gosta dos poderosos. A maior revista de economia do mundo, lá da Inglaterra, já falou que ele não presta. Mas o povo é burro”. “Toca aqui”, disse eu, dando-lhe a mão em concordância. Ele: “Já vi que você é uma pessoa inteligente, porque não vota no psicopata”, sorriu largo e acenou me despedindo.

 

Aqui quero abrir um parêntese para expressar minha furiosa angústia diante dos males que nos ameaçam e farei uma breve consideração sobre o capitão, cujo nome me recuso a grafar. Sobre ele, costumo afirmar com bastante convicção: vota-se no ‘capetão’ ou por ignorância ou por maldade. Quem tem alguma informação ou suficiente bondade, jamais apoiaria um apologista da tortura, que não tem adversários a vencer, mas inimigos a destruir – um ser do mal. Muitos, porém, na ânsia de querer ver resolvidos os problemas da violência, corrupção, contas públicas etc. apostam num boquirroto, que fala aos berros, prometendo que vai pôr ordem nessa ‘bagaça’. Mas, que ordem? Quais são os planos de governo? O que pretende fazer para pacificar a nação? Covarde, foge do debate como seu “companheiro” foge da água benta.

 

Esse homem, que pretende ser presidente, aposentou-se pelo Exército aos 33 anos de idade, acumulando salário parlamentar e soldo militar há trinta anos. Com certeza, não vai ferir interesses de sua gente, mas punirá os trabalhadores braçais, que deverão ralar para além dos sessenta e cinco anos para, então, receberem um salário mínimo como aposentadoria, se vivos ainda estiverem. Se eleito, vai pôr um general na pasta da Educação para fuçar nas universidades, impor currículos e banir do ensino médio sociologia, filosofia, antropologia e disciplinas afins. Terá na Defesa outro general, que criminalizará os movimentos sociais, tipificando-os como terroristas. Mas nada fará para extinguir ou moralizar as pensões vitalícias recebidas por filhas de militares e altos funcionários públicos, que sangram a sociedade em cerca de 10 bilhões de reais por ano. Não irá cobrar os 30 bilhões de reais de impostos dos latifundiários caloteiros nem vai extinguir o “imposto do príncipe”, que é uma taxa cobrada na aquisição de imóveis em determinadas regiões do estado do Rio de Janeiro, e que abastece anualmente com alguns milhões de reais as contas da família Orleans e Bragança, vulgarmente conhecida como ‘família imperial’.

 

Se eleito, o capitão não terá poder, porque um general fardado jamais receberá ordem de um ‘capitão reformado’. Mas, como todo ‘ser das sombras’, terá atuação subterrânea contra os pequenos: sem-terra, sem-teto, povos da floresta, operários etc. Contra estes, o terror!

 

FILIPE

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A VIÚVA ÓRFÃ

por feldades, em 13.10.18

É domingo, dia do primeiro turno das eleições – se é que haverá um segundo turno (há), ou se é que haverá outras eleições neste país (não se sabe). Pôs roupa nova, foi bonito para a urna eletrônica, porque talvez vá para uma outra ‘urna’ sem que nunca mais vote.

 

Na fila de votação, começou a ler o jornal. De súbito, alguém atravessou a sua frente e foi logo dizendo: “Uai, ocê tá aqui?” “Sim, vim votar” “Se fosse mais velho, não ficaria na fila... Eu já votei.” Olhou para aquela mulher. Ela estava com um cão, que esticava a guia impaciente, querendo sair logo dali. Mas ela, sem pressa, puxou para si o cão e deitou falação: “Aquela fedepê da juíza me chamou lá e me disse muito desaforo. Ela quer que eu pague pensão pra minha sobrinha-neta, mas eu não posso pagar. Eu já pago tanta coisa, tantas contas dela, e isso há dezesseis anos já. Mas a fedepê da juíza me disse umas boas. Falou que vai investigar minha vida, que vai ver o que tenho de dinheiro e vai me obrigar a dar pensão pra menina. O pior é que eu velha, com mais de oitenta já, cheia de doença e precisando fazer tratamento. Mas a fedepê não quis saber de nada e ainda me expulsou da sala dela. Ela é muito sem educação!” Ele tentou falar alguma coisa, mas a mulher não deixava. Ela precisava desabafar e não tinha ninguém disposto a ouvi-la. Ele não estava para tanto, mas... Quando foi possível, falou algo, sendo novamente interrompido por ela. Mas foi tentando recuperar o fio, até que deu.

 

“Ouça agora. Espere um pouco. Depois a senhora fala. A juíza não pode tratá-la assim. Você estava com advogado?” “Não. Tinha um lá... mas é do fórum.” “Nada disso, a senhora tem que ter um seu, e dos bons.” “Mas já gasto tanto e vou ter que pagar advogado?! Eu não aguento tantas despesas...” “Sim, a senhora tem que gastar mais ainda para ter tranquilidade.” “Mas eu sou sozinha, viúva, doente e velha. Não posso passar por isso, meu Deus!”

 

Um parêntese. Essa senhora, que foi casada e não teve filhos, passou a vida como faxineira, doméstica, diarista, até se aposentar com um salário mínimo. Econômica, costumava cozinhar todo o almoço numa mesma panela para economizar gás. Conseguiu alguns bens, mas teve a infelicidade de perder o marido antes da sogra – já quase centenária. O irmão do falecido, com quem ela não se dava desde a juventude, cresceu o olho no patrimônio dela e arrancou o que pôde. Mais tarde, uma sobrinha-neta precisava de cuidados, e ela, compadecida, resolveu ajudá-la. Isso gerou um vínculo, que estourou no fórum. A moça é problemática; a mãe da moça é problemática; o pai da moça... nunca se viu. Mas a juíza cismou com ela e está na sua cola.

 

Ele prosseguiu: “Conta tudo isso para seu advogado, porque sem advogado não há justiça. Juízes e promotores maus têm que se haver com a OAB.” “Mas eu não tenho OAB...” “Eu digo advogado, que é associado à OAB”. “Mas ela não pode me maltratar assim, me mandar pra fora da sala, gritar comigo, dizer que vai investigar minha vida!” ”Não, não pode, e juiz não investiga vida de ninguém. Isso não é tarefa dele. E tem mais. A senhora é quem lhe paga o salário, e deve ser muito bem tratada por ele.”  Ela quis retomar o discurso inicial, logo interrompida: “Não, a gente vai ficar falando disso aqui a tarde toda e não vai sair do lugar. Vai, minha filha, vai embora e procure um bom advogado. Assim a senhora jamais será humilhada.” “Eu, coitada de mim, sem ninguém, uma viúva...” “Não conhece a história da ‘viúva órfã?’ Tá na Bíblia!” Aqui ele se deu com uma gafe, e todos da fila o olharam com curiosidade. “Viúva órfã... Caramba! Não é bem isso. Mas que seja. Órfã da Justiça!”, pensou. Ela se foi e ele voltou para o jornal, agora sem saber onde tinha parado.

 

FILIPE

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