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Dentre as tantas bestagens que falo ou escrevo, e tendo a meu favor os anos que me são generosos, eis-me aqui novamente dedilhando o teclado, espremendo o cérebro na tentativa de exprimir opinião sobre assuntos que não entendo. Velhos, somos mais livres pra falar bobagens, mas só pra falar ou escrever; porque fazê-las exige algo mais, além da ‘falta de juízo. Por isso mesmo, e ficando apenas nas palavras, venha comigo.
Quando me falta assunto, costumo dizer que “morro de dó de quem tem muito dinheiro e pouco tempo de vida”. E vou além. “Pessoas muito ricas deveriam viver duzentos, trezentos, quatrocentos anos. Quanto maior a fortuna, maior deveria ser seu tempo de vida. Pobres não carecem de longevidade, porque o fardo lhes pesa, encurvando o corpo para o chão, para a cova, que pode ser rasa mesmo”. [obs.: há ironia]
Agora vamos aos ricos, aos milionários, aos biliardários. No Brasil, segundo a revista Exame, há mais de quatrocentos mil milionários, e sessenta e nove bilionários – em dólares! Mais: esses últimos têm, juntos, um patrimônio superior a duzentos bilhões de dólares, que perfazem algo bem mais do que um trilhão de reais. No topo da lista da Forbes está Eduardo Saverin, sócio do Facebook. Esse cidadão, a quem chamo de Dudu, tem fortuna de 16 bilhões de dólares, o equivalente a nada menos do que 90 bilhões de reais. Alguém que me lê tem ideia do que isso significa? Eu não tenho, mas vou me esforçar pra entender.
Para os meus conterrâneos, os que nasceram ou moram na cidade mineira de Guiricema, a conta é um pouco mais simples e a compreensão mais palpável. Aquele município tem aproximadamente 300 quilômetros quadrados, o que significa cerca de 30 mil hectares ou algo um pouco menos de 10 mil alqueires. Aqui, pretendo fazer uma continha de padeiro e para isso, como se vê, vou arredondando os números para torná-los mais simpáticos.
Agora embarque comigo num delírio ainda mais ousado. Vamos supor que o Dudu, aquele sócio do FB, resolva criar umas vaquinhas e queira comprar toda a zona rural do município de Guiricema. Então os fazendeiros e sitiantes se animam e decidem numa assembleia vender suas terras, mas ao preço de 180 mil reais o alqueire. O Dudu olha no site do município e confirma a área, que multiplicada por esse valor, percebe que terá de desembolsar a bagatela de 1,8 bilhão de reais. Ele aceita, fecha o negócio e paga. Pasmem! Com apenas ‘dois por cento’ de seu patrimônio, o homem mais rico do Brasil pode comprar toda a zona rural de um município com quase dez mil habitantes!
No Brasil, a riqueza está concentrada, mas nunca sabemos ao certo quem são os milionários nem o tamanho real de sua fortuna. Os números publicados são autodeclarados ou vêm da Receita Federal. Apenas uns poucos empresários e quem vive de salário têm todo o seu patrimônio e rendimentos monitorados pela Receita. Os demais, particularmente os rentistas, passam ao largo do Fisco.
Um ditado que ouvi dias atrás de uma senhora muito sábia diz o seguinte: “Há duas coisas que quem tem não conta pra ninguém: dinheiro e hemorroida”. Infelizmente ou felizmente, não tenho nem uma coisa nem outra, mas quero que os ricaços sejam taxados.
FILIPE
Foi um dia de júbilo. Talvez poucas pessoas e em poucos momentos da vida possam experimentar a alegria que senti ao chegar à casa dessa família.
Havia anos que não os via, e mais anos se passaram sem que eu os visitasse. Certo dia, porém, após inúmeras tentativas frustradas, desembarquei em Umuarama, no estado do Paraná. Chovia muito naquela manhã quando o meu ônibus estacionou numa rodoviária moderna e envidraçada. Desci do ônibus, mas eu não conseguia achar a minha amiga e fiquei meio desorientado. Finalmente a vi no primeiro pavimento, onde ela estava há uns bons minutos me esperando.
Na foto acima está a amiga ‘tia Nice’, que não é minha tia, mas é minha tia, e no final explico por quê. Ao seu lado, o esposo Antônio – caboclo bom, sistemático, de palavra firme e acertada; à esquerda, a filha Fabiane – moça inteligente, culta, que foi minha aluna ainda nos últimos "soluços" do século passado. Faltou na foto a advogada Renata, a outra boa filha da tia Nice.
Mas, afinal, quem é a ‘tia Nice’? Em poucas palavras: é uma mulher simples, amável e de um dulçor incomum. Todos os dias trocamos mensagens e isso muito me alegra. Mulher de poucas letras e de muita sabedoria, tempos atrás esteve às voltas com os estudos. A coitada ficava aflita, querendo desistir, mas foi firme até concluir o ciclo. Certamente foi apoiada por professores decentes e colegas sensíveis.
Sobre o tio Antônio, tenho uma pequena história pra contar. Caso ele se aborreça comigo, corro aqui pra apagar essa parte e depois lhe peço desculpas. Mas, por enquanto, ‘vale o escrito’.
Certa vez, um parente dele muito ‘gente boa’, mas meio atrapalhado, chegou tarde da noite e lhe pediu pouso. O tio Antônio ouviu aquilo e, cabreiro, quis saber por quê. “Eu briguei com a minha mulher e resolvi sair de casa”, explicou o desafortunado ‘briguento’. “Ah, é?... Brigou e fugiu... Pois então volte pra sua casa. Eu até te dou pouso, mas apenas se ela não te deixar entrar. Na rua você não vai ficar, mas, antes, volte lá e veja o que acontece”, sentenciou tio Antônio.
O homem coçou a cabeça, quis dizer mais alguma coisa, mas percebendo que não convenceria o seu velho camarada, decidiu voltar pra casa. Aceito pela esposa, fizeram as pazes e todos, inclusive o ‘marido fujão’, deram muitas graças a Deus pelo reenlace.
Pois é... Esse aí é o tio Antônio! Homem determinado, nascido e criado nos cafezais das Araucárias e maturado no aço das fábricas e montadoras do ABC paulista.
Voltando ao dia venturoso da minha visita, tive o prazer de passar a manhã e um pedaço da tarde naquela casa. Raramente em minha já surrada vida eu me senti assim, tão acolhido e abraçado. Há uma regra não escrita para visitas, que diz o seguinte: “Quem chega, traz a prosa; quem recebe, dá o café”. Pois naquela casa eu recebi o café, o pão e a prosa!
Agora a explicação do porquê de ‘tia Nice’. A quem pense ser parentesco algo necessariamente ligado a “laços sanguíneos”, sou assertivo: “os ‘meus parentes’ não são determinados pela biologia; sou eu quem os escolhe e tenho por critério o afeto!”
A sua bênção, tia Nice!
FILIPE
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