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A imagem é soberba e sobre ela nada precisaria ser dito ou escrito. No entanto, tentarei tecer algumas linhas – não com o rigor daquelas tecidas pela amiga aí da foto, é claro.
Tudo isso me fez lembrar Gilberto Gil e seu belíssimo poema intitulado “Oriente”, no qual ele diz que a “aranha vive do que tece”. Da Elis Regina, outro ícone da MPB e em singular interpretação dessa música, ouve-se que a “aranha duvido que tece”. Não sei o que moveu a Elis, mas para mim essa é mais uma prova de sua genialidade. Provavelmente ela tenha ouvido a música uma única vez e já foi para o estúdio gravá-la. Para alguém que não fosse a Pimentinha, mesmo que ensaiasse por vários dias, jamais brilharia.
Ah, aranhas... Ainda há quem as repila, mas aprendi admirar essas tecelãs silenciosas. Seu trabalho é noturno e engenhoso, e a matéria-prima de seu engenho é uma tênue fibra que brota de seu abdome pela qual, numa espécie de bungee jump, a artesã gangorreia enquanto tece.
As aranhas sempre me fazem lembrar um camelô que arma sua barraca num ponto privilegiado da cidade. Ali, pacientemente é esperado o “cliente”, que não tarda a aparecer. E neste momento, estou a apenas três metros da “minha aranha”. Como sua tenda fica discretamente num canto da varanda, firmamos um “pacto de paz e de não agressão”.
Todas as manhãs, contudo, eu a observo furtivamente e noto que sua casa está bem arrumadinha. Caprichosa, durante a noite ela faz faxina e retoca a teia, deixando a sua rede refeita e limpa. Assim ela pode esperar sossegadamente pelo almoço e o jantar, que costumam vir com fartura.
As aranhas tecelãs têm outras utilidades além de reduzir o número de insetos indesejados e inspirar ‘cronistas marginais’. Até os beija-flores precisam delas, porque essa teia é a argamassa para se fazerem ninhos seguros e resistentes. Já vi colibri visitando a ‘dona aranha’ e arrancando parte de sua ‘barraca’ sem que ela pudesse defender seu patrimônio.
Pior sorte teve a tanajura cuja imagem abre esta crônica. Não sei o que aconteceu ali, mas é fato que o aracnídeo, por ser “exigente à mesa”, não faz de toda presa uma refeição. Ontem mesmo encontrei uma pequena barata ferida e decidi doá-la à minha amiga. Com um papel, apanhei a moribunda e a lancei contra a teia, que a reteve. A ‘dona do barraco’ despertou de seu sono, que parecia profundo, e se aproximou desconfiada do provável petisco. Com as patas dianteiras, que ficam a “quilômetros” da boca, ela começou a examinar cuidadosamente cada detalhe da agônica baratinha, que esperneava aterrorizada diante de sua algoz. Saí de perto, deixando-as em paz (ou em guerra) e fui cuidar de meus afazeres. Quando voltei, não havia mais barata na teia e a aranha já estava recolhida aos seus aposentos. Não sei se houve acordo entre elas, mas também não acredito que a aranha tenha sido indulgente com sua “visita”.
Se a tanajura ou a barata escaparam, acho difícil. O certo é que neste momento a aranha parece feliz e realizada, descansando em seu casulo. Até que reapareça o intruso beija-flor!
FILIPE
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