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    Que lindo! Uma história de amor real!






A CAPTURA

por feldades, em 05.11.23

PHOTO-2023-10-29-15-34-45 (1).jpg

A imagem é soberba e sobre ela nada precisaria ser dito ou escrito. No entanto, tentarei tecer algumas linhas – não com o rigor daquelas tecidas pela amiga aí da foto, é claro.

 

Tudo isso me fez lembrar Gilberto Gil e seu belíssimo poema intitulado “Oriente”, no qual ele diz que a “aranha vive do que tece”. Da Elis Regina, outro ícone da MPB e em singular interpretação dessa música, ouve-se que a “aranha duvido que tece”. Não sei o que moveu a Elis, mas para mim essa é mais uma prova de sua genialidade. Provavelmente ela tenha ouvido a música uma única vez e já foi para o estúdio gravá-la. Para alguém que não fosse a Pimentinha, mesmo que ensaiasse por vários dias, jamais brilharia.

  

Ah, aranhas... Ainda há quem as repila, mas aprendi admirar essas tecelãs silenciosas. Seu trabalho é noturno e engenhoso, e a matéria-prima de seu engenho é uma tênue fibra que brota de seu abdome pela qual, numa espécie de bungee jump, a artesã gangorreia enquanto tece.

 

As aranhas sempre me fazem lembrar um camelô que arma sua barraca num ponto privilegiado da cidade. Ali, pacientemente é esperado o “cliente”, que não tarda a aparecer. E neste momento, estou a apenas três metros da “minha aranha”. Como sua tenda fica discretamente num canto da varanda, firmamos um “pacto de paz e de não agressão”.

 

Todas as manhãs, contudo, eu a observo furtivamente e noto que sua casa está bem arrumadinha. Caprichosa, durante a noite ela faz faxina e retoca a teia, deixando a sua rede refeita e limpa. Assim ela pode esperar sossegadamente pelo almoço e o jantar, que costumam vir com fartura.

 

As aranhas tecelãs têm outras utilidades além de reduzir o número de insetos indesejados e inspirar ‘cronistas marginais’.  Até os beija-flores precisam delas, porque essa teia é a argamassa para se fazerem ninhos seguros e resistentes. Já vi colibri visitando a ‘dona aranha’ e arrancando parte de sua ‘barraca’ sem que ela pudesse defender seu patrimônio.

 

Pior sorte teve a tanajura cuja imagem abre esta crônica. Não sei o que aconteceu ali, mas é fato que o aracnídeo, por ser “exigente à mesa”, não faz de toda presa uma refeição. Ontem mesmo encontrei uma pequena barata ferida e decidi doá-la à minha amiga. Com um papel, apanhei a moribunda e a lancei contra a teia, que a reteve. A ‘dona do barraco’ despertou de seu sono, que parecia profundo, e se aproximou desconfiada do provável petisco. Com as patas dianteiras, que ficam a “quilômetros” da boca, ela começou a examinar cuidadosamente cada detalhe da agônica baratinha, que esperneava aterrorizada diante de sua algoz. Saí de perto, deixando-as em paz (ou em guerra) e fui cuidar de meus afazeres. Quando voltei, não havia mais barata na teia e a aranha já estava recolhida aos seus aposentos. Não sei se houve acordo entre elas, mas também não acredito que a aranha tenha sido indulgente com sua “visita”.

 

Se a tanajura ou a barata escaparam, acho difícil. O certo é que neste momento a aranha parece feliz e realizada, descansando em seu casulo. Até que reapareça o intruso beija-flor!

 

FILIPE

 

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4 comentários

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De Pedro B. a 07.11.2023 às 15:46

Também firmei um pacto de não agressao com as aranhas do meu quarto. Acabei percebendo que Marlene e Clotilde são criaturas boêmias que descem todas as noites de sua casa pra dar um rolê. E nesse processo de observaçao martelava sempre, como um mantra, a canção da Dona Aranha, que subiu pela parede, mas veio uma chuva forte e a derrubou... "musiquinha triste da porra", eu pensava, "a aranha nunca termina seu trabalho". Demorei um tempo repetindo esses versos ate compreender a genialidade do ensinamento dessa canção infantil que reproduz o mito de Sísifo, escalando eternamente uma montanha sem jamais chegar ao topo. Acabei também entendendo o motivo de todo o carinho que nutro por minhas companheiras que compartilham comigo, em sua atividade cotidiana, a mais pura sina da condição humana. Marlene e Clotilde são minhas amigas, estamos juntos nessa vida. Delicia de cronica, que venham sempre mais baratas e beija-flores.
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De feldades a 08.11.2023 às 09:56

Olá, Pedro.
Então não estou sozinho nessas divagações.
Mas as suas amigas devem ser mais felizes do que a minha companheira, porque têm nome! Preciso ver isso com certa urgência.
Obrigado pela leitura e pela participação.
Fraternal abraço.
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De Frei Gabriel a 13.11.2023 às 15:52

Pois eu também sou admirador das aranhas tecelãs. Embora muitas vezes
no passado, tenha atazanado a vida delas, seja libertando presas, seja capturando rivais e colocando nas suas redes, ou mesmo arremessando insetos perigosos à sua sobrevivência.
Crônica gostosíssima.
Valeu, Mano!
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De feldades a 15.11.2023 às 10:58

Olha que eu não sabia dessas traquinagens de quem depois se fez franciscano...

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