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A OLIMPÍADA DE ALINE

por feldades, em 19.08.16

 Artigo encaminhado ao jornal "A Tribuna de Amparo"

ALINE.jpg

 

Aline estava de volta à “Luiz Leite”, uma escola pública onde estudou da quinta série ao terceiro colegial. Como convidada, falava de sua trajetória para uma pequena plateia de jovens como ela, que sonha com uma vida melhor e um mundo mais justo. De família humilde, Aline quis quebrar o paradigma da perpetuação da pobreza, típica de uma sociedade capitalista e cruel como a nossa. Para isso, teve que estudar, enfrentar dificuldades, transpor barreiras e amassar com pés e mãos o barro que emoldura o triunfo dos fortes.

 

Terminado o Ensino Médio, Aline entrou num cursinho pré-vestibular, que ela mesma pagava com seu pequeno salário de ajudante de manicure. Sem tempo de sair, de se divertir, a sua rotina se resumia ao serviço, estudos e nada mais. Prestou vestibular ao final do ano, mas não conseguiu passar. Com apoio dos pais, parou de trabalhar para se dedicar exclusivamente aos estudos preparatórios, intensificando ainda mais a sua já fatigante jornada. Saia cedinho para o colégio, onde se reunia com colegas, e lá costumava ficar estudando o dia todo, muitas vezes dividindo um marmitex como almoço. Se a fome era grande, a grana era pequena e ela não podia se dar ao ‘luxo’ de fazer uma refeição completa. E assim, durante um ano inteiro, do amanhecer até altas horas, ela só teve tempo para equações, textos, análise sintática e redações. Todas as outras coisas deixaram de ser prioridade: namoro, encontros, baladas etc. Até que Aline adoeceu com estresse e pneumonia. Mas ela não desistiu. Curada, a jovem guerreira estava de volta ao “front”, empunhando com garra seus livros e cadernos.

 

Chegada a temporada de exames, Aline foi aprovada no curso desejado em duas universidades federais além da PUC de São Paulo, pelo Prouni. Agora, a sua dificuldade residia na escolha da faculdade – que charme! Optou por uma e lá se foi a garota com apenas duas malinhas e uns poucos reais no bolso. Se desistisse, não teria como pagar a passagem de volta... Mas Aline jamais desistiria!

 

Contudo, a luta de Aline estava apenas começando. Ingressa na faculdade, sem dinheiro, teve que batalhar por moradia, material didático, pela sobrevivência. Não bastasse isso, veio a enfermidade do pai, que infelizmente faleceu.  Nesse período, pôde contar com a ajuda de colegas e as inúmeras rifas que sua mãe vendia, mas ela não ficou à mercê da boa vontade alheia. De início, trabalhou como faxineira nos finais de semana, depois deu aulas, foi monitora e desenvolveu projetos acadêmicos remunerados até a conclusão do curso.

 

Esta é a história da filha de um padeiro e de uma merendeira, que acaba de se formar em medicina pela Universidade Federal de Juiz de Fora, uma das mais tradicionais do País. Por isso, nestas Olimpíadas, quando o país-sede ostenta um mingau ralo de medalhas, doutora Aline Pavani representa um povo aguerrido que não medra, que luta e vence.

 

Que se curvem à Aline e a outros anônimos os deuses do Olimpo, porque a esses heróis pertencem todos os pódios e todas as medalhas!

...............................................................................

 

UM ADENDO

 

Aline fez algumas ressalvas em relação ao texto acima e me pediu que o “retificasse” com um adendo. Reclamou com todo direito que, num artigo sobre ela, não ficaria de bom-tom tachar de “capitalista cruel” a sociedade na qual vivemos, uma vez que alguns desses “capitalistas” não mediram esforços ao ajudá-la. E cita três famílias: Salles Barbosa, Furtado e a família Vida, todas “capitalistas”, a quem está infinitamente agradecida. Por outro lado, os “esquerdistas” não lhe deram sequer apoio moral.

 

Não se pode generalizar e Aline tem razão em me ‘repreender’. Há ricos generosos e pobres sovinas. Cristo, embora condenasse os avarentos de seu tempo, foi acolhido por gente rica. Mas continuo crítico da “sociedade capitalista”, porque não me parece razoável que o pobre tenha que depender de altruísmo para se erguer na vida.

 

Sobre os “esquerdistas” falastrões, sem comentários. Há muita gente moralista, dizendo-se de esquerda, arrotando honestidade, mas com práticas obscenamente injustas. Tão cruéis, quanto os capitalistas acusados de sonegar direitos sociais.

 

Desculpe-me pelo mau texto, Aline. Não quis fazer discurso ideológico sobre sua trajetória, mas contemplá-la como um símbolo de quem, como poucos, lutou e venceu.

 

FILIPE

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15 comentários

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De Everton Souza a 19.08.2016 às 17:40

Felipe, nós que conhecemos a realidade dela podemos realmente dizer que ouro é pouco para ela; uma medalha de diamante ainda sim não conseguiria honrá-la de acordo com os seus merecidos resultados.
Todos os valores, todas as honrarias, todas as glórias a esta simples mulher que um dia se considerou inglória.
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De aureliano a 19.08.2016 às 20:27

Belíssima história nestes tempos de olimpíada em que a rede Globo é a primeira a explorar os "deuses" do Olimpo no Rio de Janeiro: entrevistas, filmagens, estúdios... que, certamente, entristecem mais do que alegram os desejosos de vencer na vida. São blá-blá-blás que não ajudam em nada.
A história de Aline reforça a opinião de que o esforço pessoal somado à parceria familiar e às amizades verdadeiras podem fazer a diferença na história pessoal e transformar a comunidade.
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De Carlos Lopes a 19.08.2016 às 21:30

Lendo a bela postagem A Olimpíada de Aline, veio no pensamento a música de Milton e Fernando Brant, Maria,Maria

De uma gente que rí
Quando deve chorar
E não vive, apenas aguenta

Mas é preciso ter força
É preciso ter raça
É preciso ter gana sempre
Quem traz no corpo a marca
Aline, Aline
Mistura a dor e a alegria
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De CECILIA a 20.08.2016 às 19:15

Parabéns Aline é de gente assim que precisamos para vermos o mundo com outros olhos. Que Deus a proteja sempre.Grande guerreira.
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De feldades a 25.08.2016 às 01:32

Professora Cecília, a educação é capaz de revolucionar, não?!
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De feldades a 25.08.2016 às 01:30

Como sempre, o Carlos está impregnado de música e poesia!
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De Everton Souza a 20.08.2016 às 12:12

Generalizar é sempre ruim, mas sabemos que os capitalistas cruéis, que são a maioria, são os responsáveis pela degradação do continente africano, pela usurpação dos nossos bens, enfim, pela expropriação de tudo o que o mais pobres possuem e possuíam: a sua força de trabalho.
Claro, há bons capitalistas e que são altruístas... mas são como agulha no palheiro.
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De feldades a 20.08.2016 às 16:53

Everton, se os direitos individuais e coletivos fossem respeitados, essa discussão perderia sentido.
Obrigado pela colaboração!
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De Everton Souza a 20.08.2016 às 18:37

Sim, concordo...
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De Aline, aquela da Olimpíada. Rs a 21.08.2016 às 00:19

Olá Felipe e demais.
Muito obrigada pela consideração em escrever algo tão romantizado e profundo. Agradeço pela correção de igual forma, independente da discussao política, é muito gratificante ver as.pessoas respeitando a opinião alheia. Fico muito honrada em receber uma homenagem tal qual essa. Muito obrigada a todos, desde aqueles que ficaram felizes desde o início, passando pelos meus pilares, até os que ficam felizes após descobrirem o trajeto até aqui. Essa demonstração de carinho é o que move o mundo. Mto obrigada mesmo
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De Eduardo de Moura Lima a 21.08.2016 às 04:38

Bronze para quem a ajudou, prata a família e amigos e ouro para Aline.
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De Márcio José dos Santos a 22.08.2016 às 16:13

Filipe, que grata surpresa o seu blog e as suas postagens! Naveguei aqui com satisfação, pois são singelas e belas as suas crônicas.
Aproveito para dar os parabéns a Aline, mas também para concordar com você: a sociedade capitalista é cruel, basta a constatação de que pessoas vivem miseravelmente, enquanto uma minoria ostenta luxo e abuso de poder; mas que isto não significa um julgamento das pessoas, individualmente, pois há pobres de espírito miserável.
Grande abraço do Márcio.
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De feldades a 25.08.2016 às 01:27

Márcio, meu nobre conterrâneo e exímio cronista, que alegria tê-lo por aqui!
Costumo divulgar seu blog, onde costumo descansar minhas retinas.
Obrigado pelas palavras.
Abraços!
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De Renato a 25.08.2016 às 19:16

A perseverança é algo incrível. Talvez, ou melhor, com certeza uma das mais belas virtudes humanas. Infelizmente nem todos a cultivam.
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De frei Gabriel a 26.08.2016 às 02:42

Que exemplo de vida, de batalhadora, de aproveitar os dons de Deus, de não desistir dos sonhos, de lutar por um ideal nobre, tudo isso na bela - e sofrida - trajetória de Aline. Deus te faça muito feliz, Aline! Que possas levar o dom da saúde para muitos que poderão contar com o toque da tua bondade, da tua sabedoria, do talento trabalhado!
Felipe, pena que não sou escritor para falar das tuas suadas lutas para se formar professor! Há muito de parecido com a nossa ilustre conterrânea! Mas o importante é que você tem usado de tudo isso que acumulou no passado sofrido entre estudos, precariedade, trabalho pesado e hoje nos brinda com alguns valiosos quilates do ouro de uma sabedoria cada vez mais acumulada e partilhada! Ouro para Aline! Ouro para você também, grande mano!

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