Saltar para: Post [1], Comentários [2], Pesquisa e Arquivos [3]





ESCOLA PARA QUÊ?

por feldades, em 16.09.16

Além de inteligente, fina, ela é uma aluna muito aplicada. Dia desses, me interrompeu com uma pergunta: “Professor, sem querer ser grosseira, para que vai servir isso que você está ensinando? De prático, em que vou poder usar na minha vida, por exemplo?”

 

De uns tempos para cá, é muito comum o aluno questionar os porquês de se aprender determinado conteúdo. Quando era estudante e não conseguindo entender um tópico de álgebra, procurei o professor em particular e perguntei educadamente para que serviria aquilo. Ele, “muito gentil”, respondeu: “Primeiro você aprende isso, depois pergunte para que serve”. Fiquei tão embriagado de satisfação, que saí sem lhe agradecer.

 

Muitos “educadores” – uma gente à toa, que não dá aula, mas passa a vida inventando coisas e publicando bobagens – costumam afirmar que o professor deve contextualizar tudo o que ensina para que o aluno seja estimulado a aprender. Concordo. Mas aquela gentalha vai adiante: “Se o aluno não sabe onde vai usar o que aprendeu, como vai se interessar pela aula?” – emenda a besta, que só sabe futricar com a vida de quem trabalha. Quando surgem perguntas assim, normalmente respondo que o ENEM, os vestibulares e os concursos cobram. Noutras vezes, costumo dizer que aquilo não serve para nada, que a escola poderia fechar e dispensar a todos e que a sociedade economizaria muito com a extinção do ensino. Por que aprender Literatura, História, Geografia? Vai usar poesia onde?... A História foi escrita pelos vencedores, logo é mentirosa. Geografia é algo provisório, porque as fronteiras se movimentam sempre. Melhor mesmo é aprender uma profissão e ganhar a vida, fazendo pães, apertando parafusos, assentando tijolos, instalando antenas parabólicas... Opa! Eu disse ‘parabólicas’?!  

 

Mas voltando à mocinha lá em cima, o conteúdo que lhe causou aborrecimento é bastante simples: equações quadráticas, que geram gráficos denominados parábolas e que são a base da tecnologia de transmissão de sinais em telecomunicação. Sem esse conhecimento, as tais ‘antenas parabólicas’ não existiriam e alguém já ficaria sem emprego! Expliquei à mocinha, que até o século dezenove muitas equações eram de amplo domínio, mas sem emprego prático. Caso os alunos de outros tempos aprendessem apenas o que lhes fosse de uso imediato, talvez estivéssemos ainda rolando cargas sobre toras, como fazíamos há alguns milênios.

 

Semana passada, a imprensa publicou matéria sobre a educação no País, dando destaque para Matemática: os alunos do Ensino Médio estão cada vez piores nessa disciplina. Fico tomado de angústia quando leio coisas assim. Mas, pensando bem, de quem é a culpa? É óbvio que é do governo, mas vamos fugir das obviedades. Não seria também dos pais, dos mestres, dos próprios alunos? Não sei responder. Mas sei que nosso aluno, em geral, está cada vez mais preguiçoso, não quer estudar, não quer pensar!

 

Albert Einstein, quando esteve no Brasil, impressionou-se com a malemolência do brasileiro. O ‘Pai da Relatividade’ teria afirmado que “o calor dos trópicos amolece o caráter do brasileiro”. Maldade à parte, penso que deveríamos ser mais responsáveis com nosso ensino formal. Se ‘a escola existe para desasnar o povo’, conforme ensina Renato Janine Ribeiro, ‘a sala de aula deve ser uma oficina de pensamento’. E um povo que não sabe pensar, não pode sequer sonhar um projeto de nação.

 

FILIPE

Autoria e outros dados (tags, etc)


12 comentários

Sem imagem de perfil

De Anónimo a 16.09.2016 às 10:24

Muito bom, vou compartilhar!
Sem imagem de perfil

De Everton Souza a 16.09.2016 às 15:14

Caro Felipe, com tanta informação hoje disponível e ainda sim esses "Gênios" não sabem a finalidade das coisas que são ensinadas na escola.
O sistema educacional tem como meta isso mesmo, gerar ignorantes, que leem mas não entendem, que escutam mas não assimilam, que são manipulados e não percebem. Pode ter certeza que aluno assim será diplomado ao fim do curso.
Imagem de perfil

De feldades a 23.09.2016 às 23:08

Quando fiz esta postagem pensei: O Everton já está escrevendo sobre isso!
Ainda assim, arrisquei.
Mas quero ler seus artigos, porque são mais completos.
Abraços!
Sem imagem de perfil

De Renato Pires de Godoy a 17.09.2016 às 17:06

Caro Felipe, bom dia. É realmente difícil dizer aos alunos que o que ele(a) aprende, se trata de vários conjuntos de conhecimentos que a humanidade levou milênios para construir, e que ele(a) tem o direito a ter acesso aos mesmos. Quando se fala de economizar com o ensino público, eu vejo que o estado deveria sim garantir a universalização do ensino, porém não exigir sua obrigatoriedade. Dessa forma estudaria que realmente desejasse, os cofres públicos economizariam e teríamos menos problemas em sala de aula. Além do que daríamos a liberdade de escolha ao jovem cidadão, de querer ou não estudar. Abraço meu estimado amigo.
Imagem de perfil

De feldades a 23.09.2016 às 23:11

É, Renato, tudo que é obrigatório torna-se enfadonho.
Deveria ser facultativo: estuda quem quer e ponto final.
Sem imagem de perfil

De Carlos Lopes a 17.09.2016 às 23:45


Não tenho como comentar essa bela e triste postagem; mas tenho o direito de lastimar.
Nunca lecionei e penso o que faria com uma pergunta da sua ilustre aluna aplicada...
A falta de compromisso, responsabilidade da maioria dos estudantes são desanimadoras; não respeitam os mestres e nem as disciplinas, a escola faz parte de suas rotinas.(para quê ?)
Imagem de perfil

De feldades a 23.09.2016 às 23:14

Este é o amigo Carlos: como sempre, muito lúcido!
Imagem de perfil

De aureliano a 18.09.2016 às 18:35

Penso que o problema não está na aluna, mas no sistema educativo-econômico-político-social que colocou esta pergunta na mente e no coração dela. Vivemos numa sociedade do ter, do poder, do fazer. O ser anda na sombra da humanidade. Enquanto se pensar que o sentido da vida consiste no fazer muito, no ter mais, no utilitarismo da vida, experimentaremos aridez nas relações, estupidez nas palavras, latência do uno, do belo e do bem...
Imagem de perfil

De feldades a 23.09.2016 às 23:17

Aureliano, a questão é por demais profunda! Há uma velinha acesa no fundo desse buraco, ou só lama e trevas?
Imagem de perfil

De Maria Araújo a 21.09.2016 às 13:53

Excelente post, excelentes comentários.
Mas feldades, garanto que aqui neste país à beira-mar plantado, Portugal, é a mesma coisa.
Hoje, a maioria dos jovens não quer saber da escola nem pensa na sua utilidade para o futuro.
O esforço é nulo.
Imagem de perfil

De feldades a 23.09.2016 às 23:22

Até em Portugal? Em terras de Saramago, de Fernando Pessoa? É o fim dos tempos, penso eu.
Obrigado, Maria Araújo, pela participação.
Apareça outras vezes!
Sem imagem de perfil

De Leo a 06.10.2016 às 18:33

Falta mesmo uma força a mais dos pais, dos alunos,pois pelo menos na minha escola o aluno tem condições de aprender, não aprende porquê não quer... Acho que falta um entusiasmo por conta dos alunos.

Comentar post





Comentários recentes